sexta-feira, 15 de agosto de 2008

domingo, 14 de outubro de 2007

Tirando a Barriga da Miséria

Ao longo desse ano, tenho cansado de ouvir aquela ladainha dos rivais, principalmente dos gambás e dos porcos, de que o São Paulo é o time mais beneficiado pela arbitragem. Tenho um amigo palmeirense que chegou ao ponto de dizer que nenhum erro capital de arbitragem foi cometido contra o São Paulo no campeonato todo. Eu poderia perguntar, como de fato pergunto a todos eles quando sou interpelado nesses termos, qual seria a razão de tais benefícios, uma vez que o Tricolor paulista e o Flamengo são os dois únicos clubes que ousam se opor, ainda que de forma tímida, aos manda-chuvas do futebol brasileiro, nomeadamente, Globo, CBF e Clube dos Treze. Como contra-exemplo, lembro também de dois pênaltis inexistentes marcados contra o São Paulo: um sobre Somália, no primeiro turno contra o Fluminense e outro sobre Danilinho, contra o Atlético no Mineirão. O primeiro causou a derrota por 1x0 e o segundo teria causado o mesmo, se não fosse o milagre de Rogério Ceni.

Contudo, não entrarei a fundo nesse ponto. Contentar-me-ei em observar que, independentemente desses caras terem ou não razão, nesse fim de semana todos os abutres que secam o Tricolor puderam tirar a barriga da miséria. De fato, não me lembro de um jogo recente em que o São Paulo tenha sido tão violenta e descaradamente roubado pelo juiz quanto na partida de ontem contra o Fluminense.

Devo dizer que no primeiro tempo o São Paulo não jogou rigorosamente nada e merecia mesmo sair para o vestiário em desvantagem. O time não passou do meio campo, foi dominado pelo tricolor carioca e chegou com perigo pela primeira vez apenas aos 42 minutos, em cabeçada de Leandro defendida por Fernando Henrique. Na primeira etapa não houve nenhum problema com arbitragem, a não ser o pênalti cometido por Fabiano (que, aliás, estreou muito bem), pênalti que pode ser classificado como duvidoso (todo pênalti de goleiro é duvidoso). Mas deixemos isso passar e aceitemos que a penalidade foi bem marcada.

No intervalo, Muricy trocou Jackson por Fernando, mas não mudou taticamente a equipe. O volante atuou pela direita, como ala mesmo. O que mudou foi a disposição do time, que partiu para cima e empatou logo no início, com André Dias, no rebote, após cobrança de escanteio e cabeçada de Brenoenbauer.

Mas foi aí que o juizinho mineiro resolveu aparecer da pior forma possível: cometendo lambanças imperdoáveis. O que é pior: lambanças que sempre prejudicaram o mesmo time. E, para o espanto de corintianos e palmeirenses, esse time foi o São Paulo. Tudo começou com o pênalti escandaloso não marcado em Aloísio. O São Paulo era então melhor na partida e poderia ter virado o jogo nesse lance, o que jogaria a pressão toda para cima do Flu e faria com que o time paulista pudesse atuar da maneira que mais gosta: administrando o resultado. Mas o senhor Ricardo Marques Ribeiro, um Zé Ninguém que queria fazer seu nome, não só ignorou a penalidade como ainda, muito presunçosamente, aplicou um amarelo em Aloísio.

Mas o pior estava por vir. O Fluminense equilibrou o jogo, que ficou lá e cá. Isso até o palhaço apitar mais um pênalti contra o São Paulo. Sem dúvida foi um dos pênaltis menos pênaltis dos últimos tempos. Gabriel entrou na área e mergulhou, enquanto Hernanes, com toda sua elegância de Falcão misturado com Toninho Cerezo, até tirou o corpo, mostrando para todos que não havia sequer tocado no lateral adversário. Mas o perspicaz ladrão não teve dúvida: apontou para a cal e soprou seu apito, emitindo o som dos larápios. Incrível como ele inverteu tudo: deixou de marcar pênalti claríssimo no Aloísio e deu cartão para ele por simulação. Depois, em vez de dar cartão para Gabriel, por manifesta simulação, marcou um pênalti visivelmente inexistente. Resumindo: dois erros (ou será que eu deveria grafar “erros”) que se transformaram em quatro. Sorte que Fabiano nos apresentou à sua estrela e pegou a penalidade, mostrando para o Bruno que eu estava certo quando vaticinei: nasce aqui o sucessor de Rogério Ceni.

Mas ainda não acabou, não. Ajudando a defesa, Aloísio cometeu uma falta absolutamente comum, falta de jogo, nada de mais. Mas lá vem o lazarento, já colocando a mão no bolso do calção. Quando vi essa cena, eu não acreditei: “Já não basta o filho da puta ignorar um pênalti claro para nós, marcar uma absurdidade de pênalti para o adversário... e agora essa?”. O pior não foi nem esse segundo cartão amarelo. Foi aquele primeiro, que Aloísio tomou por ter SOFRIDO um pênalti. Além de complicar o final de jogo para o São Paulo, o panaca do apito criou mais um problema para Muricy. Pois na partida seguinte (contra o Cruzeiro, diga-se de passagem) o Tricolor pode ficar sem atacantes: Tardelli saiu machucado e não sabemos a gravidade; Dagoberto é uma incógnita; Borges não volta tão cedo e Aloísio agora está suspenso. Desse jeito, será preciso lançar mão de Thiago Eto’o, que inclusive substituiu Tardelli no jogo de ontem, mas não teve chance de mostrar seu futebol, visto que entrou em uma fria.

Depois de tudo isso, ainda tive de escutar o Wright dizendo que o dito cujo é um dos juízes que irão passar por uma reciclagem da CBF. Não pude resistir à cornetada: “Reciclagem uma ova! Essa merda tem que ir pro lixo comum e não apitar nunca mais!”.

No fim das contas, considerando-se todas essas circunstâncias, o empate foi um excelente resultado para o São Paulo, principalmente porque Cruzeiro e Santos também não venceram. Espero que os abutres tenham ficado satisfeitos. Afinal, se eles queriam tanto ver o Tricolor ser roubado, a partida de ontem foi um prato cheio, ou melhor, um banquete dos mais fartos.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Heróis de Ninguém

Devido à máfia da televisão que controla o futebol brasileiro hoje em dia, raramente tenho a oportunidade de acompanhar um jogo entre dois times do Rio de Janeiro, seja do campeonato local ou do Brasileirão. E isso me deixa bastante triste, uma vez que a privação de embates cariocas faz com que uma de minhas primeiras e mais agradáveis experiências ludopédicas fique, a cada ano que passa, mais descolorida e perdida em algum lugar nebuloso da minha já surrada memória. Estou falando do Campeonato Carioca.

Desconfio que os torcedores paulistas um pouco mais jovens do que eu jamais assistiram a sequer uma partida inteira e ao vivo do certame mais charmoso do mundo. Felizmente minha geração ainda pegou a época em que a Band transmitia o torneio, sim, para todo o Brasil, ali pelo começo e meados dos anos 90. Ah, e que grande espetáculo era aquele! Os magníficos clássicos de domingo no Maracanã! Clássicos em que os clubes grandes mandavam a campo times verdadeiramente grandes. Até os jogos de segunda à noite, quando Flamengo, Fluminense, Botafogo e Vasco iam a alguma Rua Bariri ou Moça Bonita da vida para enfrentar o time da casa, eram sensacionais.

Eu acompanhava o campeonato dos vizinhos com a mesma ou talvez até com mais atenção do que a dedicada ao meu torneio doméstico. E torcia pelo Fluminense, talvez por alguma influência de sua tricoloriedade, predicado que une por um laço fraterno o clube das Laranjeiras e o meu time de coração. Mas esse não era o principal motivo da minha preferência pelas “três cores que traduzem tradição”. O Flu era meu time porque nele atuava meu primeiro ídolo no futebol, um herói, um super-herói, meu grande herói: o Super Ézio. Como jogava aquele Super Ézio! Centroavante grossíssimo, é verdade, mas o que importa? Ele era oportunista como poucos, sempre estava no lugar certo para balançar as redes: autêntico ruim-que-faz-gol do mais fino pedigree. E como fazia gol! Era sem dúvida um ente sobre-humano, ao menos dentro da grande área. Depois de Romário, é Super Ézio na cabeça. Pobre Madureira! Quantos gols o infeliz tricolor suburbano não levou do demoníaco matador, assassino nato de goleiros? Era cruel, muito cruel aquele artilheiro! Um pecado dos mais lastimáveis é o fato de Nelson Rodrigues não ter vivido para ver o Super Ézio em ação. Imaginem quantas e quão fabulosas crônicas não teriam nascido nas tintas daquele genial e fanático tricolor.

Um tal mito, uma tal lenda, uma tal aura que se configurou em torno de um jogador aparentemente comum não poderia surgir senão a partir da obra de outro gênio. Foi, de fato, a voz marcante de um divino locutor o solo fértil no qual tal figura pôde verdejar. Ficou a cargo de Januário de Oliveira, um verdadeiro rapsodo das sagas ludopédicas, a tarefa de cantar as gestas épicas do herói. Além do “cruel, muito cruel” já citado, o folclórico Januário criou bordões inesquecíveis, que integrarão a antologia do esporte até o fim dos tempos. Ainda hoje posso ouvir, ecoando em minha memória, a frase que se seguia ao apito inicial: “Bola rrrrrrolando no Maracanã!”. E também aquele brado altissonante, pronunciado toda vez que um atleta ficava prostrado no solo: “TÁ LÁ mais um corpo estendido no chão!”. Sem falar no comentário singelamente jocoso, apresentado sempre que um boleiro realizava uma lambança bisonha: “Sinistro, muuuuito sinistro!”.

Januário era um artista. Januário pintava quadros e esculpia mármores com a vós. Impressionante como ele conseguia transpor para a TV a magia e a potência criativa da narração do rádio. Só ele foi capaz de realizar esse feito. Super Ézio foi sua criação máxima, sua obra-prima. E o Ézio real não decepcionava: castigava as redes como um sádico. Todo jogo do Flu com Januário no microfone era garantia de que o grito de louvor ao super-herói seria escutado, provavelmente mais de uma vez na partida: “Cruel, muuuuito cruel esse Super Ézio!”.

Esse maremoto de recordações veio a inundar minha praia mental devido ao clássico do próximo domingo, o clássico dos clássicos, “o clássico que começou quarenta minutos antes do nada”. De fato, foi justamente um Fla-Flu daquela época áurea o melhor jogo de futebol que presenciei em toda minha vivência ludopédica. A finalíssima do Carioca de 95 foi um momento singular, no qual toda a eternidade do tempo se mostrou menor do que noventa minutos, no qual toda a extensão espacial do universo ficou circunscrita a uma relva de 110 por 75 metros. Foi um momento em que todos os seres vivos do planeta perderam sua individualidade e passaram a ser representados sob a forma de vinte e dois entes transcendentais; um momento em que uma reles esfera feita de epiderme bovina passou a reluzir mais que ouro e a valer mais que a pedra filosofal. Quem viu aquela final chegou ao conhecimento mais imediato do fundamento ludopédico da existência. O futebol em si, despido de suas formas acidentais, nunca se mostrou de forma mais nítida e acessível ao nosso limitador aparato sensorial.

O Flamengo era “o time dos sonhos”. No ano do centenário, Kleber Leite gastou a prata que tinha e que não tinha para montar uma seleção brasileira na Gávea: Branco, Mazinho, Sávio, Romário, entre outros. Mas tudo isso foi em vão. Pois o Tricolor, embora não tivesse nenhum craque, a não ser Renato que, no entanto, já via raiar no horizonte o crepúsculo de sua fase knocking-on-heaven’s-door, apesar disso, ia dizer, o Flu contou com a ajuda do Olimpo. Hércules e Aquiles foram enviados ao Maraca para serem os anjos protetores das Laranjeiras.

Insuflados por essa força, os guerreiros do Flu se transformaram em heróis supremos, embora fossem, em todos os outros dias das suas vidas, heróis de ninguém. O galináceo arqueiro Wellerson teve uma tarde de Castilho; Ronald, lateral direito cuja pobreza técnica era de dar dó, jogou como Carlos Alberto Torres; Márcio Costa foi um Didi da nova era; Djair armou o jogo com a elegância de um Gérson moderno e Rogerinho despendurou as chuteiras de Rivelino. No primeiro tempo, o tricolor já fazia 2x0. O time jogava tanto que até passava despercebido o pecado maior, consumado na prancheta de Joel: Super Ézio no banco!

Mas na segunda etapa o Fluminense recuou, fruto do espírito retranqueiro de seu folclórico treinador. O Flamengo foi para cima e empatou em poucos minutos. Com o jogo cada vez mais nervoso, foi necessário lançar mão do super-herói, principalmente após a expulsão de Lira. Super Ézio não fez gol, mas lá estava ele, na área adversária, distraindo os beques rubro-negros, abrindo caminho para Aílton dançar como Garrincha e desferir o petardo, chute que tinha destino certo, determinado por uma necessidade absoluta, como se todos os eventos ocorridos desde o início dos tempos houvessem conspirado para a realização daquele desfecho, o fim último de toda a existência: Renato, o Édson Arantes do dia, meteu a barriga na pelota e decretou os 3x2. Uma vitória sublime: um “cínico e deslavado milagre!”, é o que provavelmente berrava Nélson no firmamento dos gênios, provando para Kant e Platão que, diante das incontáveis improbabilidades já consumadas pelo futebol, a crença em qualquer conhecimento a priori se mostra uma doce e infantil ilusão.

Ainda bem que meu sãopaulinismo já estava consolidado em bases firmes após os anos dourados de 91, 92 e 93. Caso contrário, eu teria me tornado nesse dia um daqueles raros e estranhos seres híbridos, paulistas de nascimento, cariocas de clube, ou vice e versa. E nesse mesmo ano, ano do pior time do São Paulo que eu já presenciei, contentei-me em torcer muito pelo Flu em outra epopéia, o embate contra o Santos, na semifinal do Brasileirão. Infelizmente, no segundo melhor jogo que eu já vi, foi a vez de Giovanni encarnar Pelé e conduzir o Peixe à decisão.

O mais estranho e assustador disso tudo é que foi justamente após o mágico ano de 95 que começou o declínio do futebol carioca. Coincidência ou não, isso ocorreu a partir do momento em que Super Ézio saiu do Flu, a Band deixou de transmitir o campeonato e Januário de Oliveira foi da glória ao ostracismo. O encanto havia acabado. Não tardou para que o nível do torneio fosse lá embaixo, para que os grandes caíssem em um abismo financeiro e para que o Tricolor, sem seu super-herói, fosse parar na terceirona.

Após sair do Flu, Super Ézio sumiu sem deixar notícia. Fiquei desamparado. Depois de algum tempo, por volta do ano 2000, quando já quase me esquecera de meu primeiro ídolo, tornei a vê-lo, em um programa esportivo. Foi uma experiência tétrica, mais do que decepcionante, desalentadora, fúnebre. Eis que Ézio, já despojado do epíteto e dos super poderes, concedia uma melancólica entrevista, explicando ao repórter porque havia abandonado o futebol para seguir uma mundana carreira de representante comercial, vendedor, ambulante, caixeiro-viajante ou algo que o valha, nem me lembro. Tampouco lembro do motivo: tratei de apagar os detalhes de minha memória. Em tal momento, enquanto ouvia as palavras do ex-super-herói, veio à minha mente um trecho da música que empresta o título a este texto: “When I heard that he was gone / I felt a shadow cross my heart / But he’s nobody’s hero...”. O mesmo pensamento me veio esses dias quando lembrei de Januário. Não sei nem se ele ainda está vivo!

Enfim, todo aquele onírico mundo maravilhoso ficou para trás. Mas posso afirmar com certeza absoluta que se não fosse essa época, a Rua Bariri, o Madureira, o Bangu, o Olaria, o Januário, o Super Ézio, os heróis de 95, o gol de barriga... dificilmente eu seria tão fanático por futebol como sou. Agora resta-me esperar que a TV paga tenha a bondade de transmitir o Fla-Flu de domingo para São Paulo. Tudo bem, eu sei que não será a mesma coisa: o jogo não vale título, longe disso; o Maracanã certamente não estará lotado; Joel estará do outro lado; Renato, de calça e camisa e sem faixa na cabeça, ficará parado, restrito ao metro quadrado de sua área técnica; no campo, nada de Romário nem de Super Ézio; e na cabine, em vez de Januário, um narrador insosso do Sportv. De qualquer modo, espero que o Flu vença com um gol de barriga do Somália aos 41 do segundo tempo. A magia acabou, é fato. Mas ainda “é disso, é disso que o povo gosta... e eu também, Ádison!”.

Assista aqui ao gol de barriga narrado por Januário de Oliveira. A qualidade da imagem é péssima, mas o que vale é o áudio. O engraçado é que nem o narrador nem o repórter Ádison Coutinho, que estava na beira do campo, perceberam o desvio de Renato. Demorou mais de um minuto para eles corrigirem o erro. Se não fossem as câmeras de TV, Aílton teria ficado com a glória.

Seleção do Brasileirão


Aproveitando o embalo do Dênis, e para cobrir o espaço do meu texto que não fica pronto nunca, também resolvi fazer a minha seleção do brasileirão. O critério é para lá de subjetivo e nem sempre escolhi os melhores jogadores, mas sim aqueles que acredito que formariam um time melhor (de acordo, claro, com minha concepção de futebol) juntos. Bom, vamos aos comentários para ver se consigo criar um pouco de polêmica nesse blog!

Rogério Ceni, Miranda e Alex Silva: Quanto a estrutura defensiva (miolo de zaga + goleiro), não há o que comentar. Os números falam por si. Foi difícil escolher entre Alex Silva e Breno, mas fiquei com a experiência maior (nem tão maior, admito) do primeiro em jogar com dois zagueiros.

Joílson: Lateral/Ala bastante ofensivo. Chega muito no ataque, até demais. Exigiria um trabalho de cobertura muito bom dos dois volantes. Mas, resolvi escolhê-lo para acabar com a minha fama de retranqueiro e para compensar a falta de correria do Paulo Baier (que coloquei na meia).

Kléber: Excelente jogador. O melhor cruzamento do Brasil e um dos melhores do mundo. Mantendo a tendência desse time de chegada forte pela lateral. Além do mais, ainda pode atuar no meio.

Hernanes: Me surpreendeu e muito. Aprendeu a marcar. Tem técnica, força e habilidade para sair jogando com velocidade e precisão.

Martinez: Mantendo o estilo de um time leve, mais um volante que não é cabeça de bagre. Junto com Hernanes daria ao time qualidade na saída de bola e muita movimentação. Além do mais, seria o homem para bater faltas com o pé esquerdo.

Valdívia: É cai-cai. Prende a bola demais. Mas, que é craque, é.

Paulo Baier: Jogou sozinho no Góias. Está aprendendo a compensar a falta de velocidade (idade chegando) com passes precisos, experiência e visão de jogo. Em um mundo onde os armadores desapareceram, está acima da média.

Acosta: Faz muito gol no Naútico. E é o marginal (olha a quantidade de vezes que foi expulso) que todo time precisa ter.

Alecssandro: Faz muito gol. Ponto. (Nota: aqui fiquei em dúvida entre o Alecssandro e o Kléber Pereira que também faz muito gol.. mas, por ter jogado mais o campeonato, escolhi o cruzeirense).

Muricy Ramalho: Cornetei e continuo cornetando. Demora demais para mexer, é teimoso, deixa o time nervoso... mas, ninguém é tão bom quanto ele nos trabalhos de CT.

Breno: Só não escolhi o Felipe do Corinthians porque achei que não cabia, devido ao excelente Campeonato Paulista que ele fez. Já sabia que ele era bom antes do Brasileiro começar, logo não cabia como revelação.

Miranda: Praticamente não erra. Porto seguro da zaga menos vazada do mundo.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Seleção do Brasileirão 2007

A Gazeta Esportiva.Net e a Rede Gazeta de Televisão estão promovendo o troféu Mesa Redonda 2007. O prêmio, realizado anualmente desde 2004, é concedido aos melhores jogadores do Campeonato Brasileiro de Futebol. Dentre as várias categorias premiadas, destacam-se a de melhor jogador, melhor técnico e jogador revelação.

A eleição é aberta ao público. Para participar, basta acessar o site da Gazeta Esportiva.net e fazer as escolhas. As minhas podem ser conferidas abaixo:

(a Seleção: Rogério Ceni, Breno, Miranda, Elder Granja, Kléber, Hernanes, Martinez, Jorge Wagner, Valdívia, Dagoberto e Fernandão. O Melhor técnico: Muricy Maralho. A revelação: Breno. O melhor Jogador: Miranda)

O resultado parcial da eleição (no dia 01/10) é o seguinte:

ESQUEMA TÁTICO: 4-4-2 / 60%

GOLEIRO: ROGÉRIO CENI (SÃO PAULO) / 40%
FELIPE (CORINTHIANS) / 32%
DIEGO (PALMEIRAS) / 24%

ZAGUEIRO:MIRANDA (SÃO PAULO) / 21%
ALEX SILVA (SÃO PAULO) / 18%
BRENO (SÃO PAULO) / 14%
ZELãO (CORINTHIANS) / 10% <--- a democracia tem dessas coisas! BETãO (CORINTHIANS) / 10% <--- a democracia tem dessas coisas! GUSTAVO (PALMEIRAS) / 8% <--- a democracia tem dessas coisas!

LATERAL: KLéBER (SANTOS) / 19%
GUSTAVO NERY (CORINTHIANS) / 13% <--- a democracia tem dessas coisas! ÉVERTON (CORINTHIANS) / 10% <--- a democracia tem dessas coisas! SOUZA (SÃO PAULO) / 8% JUNIOR (SÃO PAULO) / 7% PAULO BAIER (GOIÁS) / 6%

VOLANTE: HERNANES (SÃO PAULO) / 18%
VAMPETA (CORINTHIANS) / 15% <--- a democracia tem dessas coisas! RICHARLYSON (SÃO PAULO) / 15% PIERRE (PALMEIRAS) / 11% BRUNO OCTáVIO (CORINTHIANS) / 11% <--- a democracia tem dessas coisas! MARTINEZ (PALMEIRAS) / 8%

MEIO CAMPO: VALDíVIA (PALMEIRAS) / 27%
JORGE WAGNER (SÃO PAULO) / 23%
LULINHA (CORINTHIANS) / 19% <--- a democracia tem dessas coisas! THIAGO NEVES (FLUMINENSE) / 5% CAIO (PALMEIRAS) / 4% WAGNER (CRUZEIRO) / 3%

ATACANTE: DAGOBERTO (SÃO PAULO) / 18%
FINAZZI (CORINTHIANS) / 13% <--- a democracia tem dessas coisas! ARCE (CORINTHIANS) / 12% <--- a democracia tem dessas coisas! ALOíSIO (SÃO PAULO) / 10% EDMUNDO (PALMEIRAS) / 7% KLéBER PEREIRA (SANTOS) / 7%

TéCNICO: MURICY RAMALHO (SÃO PAULO) / 56%
CAIO JR (PALMEIRAS) / 20%
VANDERLEI LUXEMBURGO (SANTOS) / 12%

REVELAÇÃO: LULINHA (CORINTHIANS) / 41% <--- a democracia tem dessas coisas! BRENO (SÃO PAULO) / 31% MIRANDA (SÃO PAULO) / 4%

MELHOR JOGADOR: ROGéRIO CENI (SÃO PAULO) / 29%
LULINHA (CORINTHIANS) / 22% <--- a democracia tem dessas coisas! VALDíVIA (PALMEIRAS) / 19%

Do jeito que vai a eleição, quem não esteve na Terra nos ultimos anos pode acabar imaginando que o Corinthians está brigando pelo topo da tabela.

Participe da eleição. Se lá no site da Gazeta os corinthianos têm avacalhado a votação, aqui, Os 3 Corneteiros, na pior das hipóteses, descerão a corneta!

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Garrincha: o gênio de que ouvi falar

Pouco importa que Manoel dos Santos, Mané Garrincha, jamais tenha, de fato, apelidado de “João” ao menos um dos defensores que tentavam, na maioria das vezes inutilmente, conter os seus avanços pelo flanco direito dos gramados. Na verdade, teria sido um jornalista quem criara esta estória, mais uma a dar corpo ao emaranhado de fatos e invenções que adornam o mito mané. Mas, neste caso, a questão do “disse” ou “não disse” não tem, por exemplo, a mesma relevância da polêmica em torno da mais célebre frase de Maquiavel, aquela que ele jamais disse, a saber, “que os fins justificam os meios”. Porque Maquiavel, além de não ter enunciado a frase que veio tornar-se a máxima do chamado “maquiavelismo”, também não elaborou, como se costuma supor, uma teoria política ressonante com essa máxima. Em Maquiavel, os fins não justificam os meios, e a idéia contrária só é possível graças a uma leitura equivocada dos textos do pensador. Mas, no caso do Mané, o fato dele não ter enunciado o “João” não muda em nada o fato dele ter dado vida, não a um somente, mas a centenas deles.

Para quem não viu Mané Garrincha jogar, como é, obviamente, o meu caso, é muito difícil descobrir, por trás dos discursos saudosistas e inflamados daqueles que o viram, testemunhas ainda boquiabertas, como o ex-jogador e amigo do Mané, Nilton Santos, os jornalistas e escritores Armando Nogueira, Nelson Rodrigues e Carlos Drummond de Andrade, quem foi e como era, realmente, o jogador. O que esses discursos apaixonados fazem é construir a imagem de alguém que estava mais para extraordinário que para o humano. Mané seria, assim, um desses seres sobrenaturais, fugidos do Olimpo, que de tempos em tempos o esporte traz à forma humana, tais como os futebolistas Pelé, Maradona, Cruyff, Zico, Leônidas da Silva, Puskas, Zidane, Yashin, Platini, Rogério Ceni e Beckenbauer, ou os incríveis tenista e nadador, respectivamente, Roger Federer e Michael Phelps, ou ainda, do boxe, os pugilistas Mohamed Ali e Mike Tyson, e, por fim, do basquete, o realmente fenomenal Michael Jordan. Para todos esses atletas, a conquista da vitória parece ser apenas um evento acidental e sem importância quando comparada aos seus poderes de tornar reais até mesmo as idéias mais ousadas que brotam na mente de um atleta. A eles tudo parece possível e, o que é mais assombroso, tremendamente fácil.

A idéia de que Garrincha, dentre outros gênios acima citados, não tenha sido um humano, como sugeriu, brincando, meu amigo corneteiro César, talvez seja a premissa necessária para explicar como alguém que foi tão brilhante dentro das quatro linhas pode, fora delas, definhar de maneira tão triste, vítima, sobretudo, do alcoolismo. Garrincha não cabia nos estreitos limites morais da sociedade brasileira, menos ainda, como se sabe, nos limites do seu próprio corpo. Não o julgo, apenas lamento o rumo que sua vida tomou, desembocando na doença, solidão e tristeza. No fim das contas, parece ser um erro querer dissociar o Mané jogador do Mané pai de família, boêmio e amante, do mesmo modo que é absurdo imaginar que suas pernas pudessem ser tortas dentro de campo e, fora dele, corretas. A respeito disso tudo, sábias mesmo são as palavras de Nelson Rodrigues: “um Garrincha transcende todos os padrões de julgamento. Estou certo de que o próprio Juízo Final há de sentir-se incompetente para opinar sobre o nosso Mané”.

O que havia de mais encantador no jogador Garrincha, ao menos de acordo com o que os relatos sobre ele permitem crer, era como ele, indiferente aos outros vinte e um jogadores em campo e até mesmo à lógica sem graça do perde e ganha do futebol, parecia ser o praticante solitário de uma modalidade esportiva diferente, criada por ele mesmo, a partir duma costela do futebol. É claro que a carreira futebolista de Garrincha foi repleta de vitórias. Ele, ao lado de Pelé e outros gênios do futebol, conquistou a Copa do Mundo de 1958, na Suécia, e, quatro anos depois, no Chile, com os gênios nas costas, a de 1962. Mas não foram simplesmente as medalhas e os troféus conquistados por Garrincha o que o elevaram à condição de mito, mas principalmente o drible, sua arte maior.

Armando Nogueira brinca que, “para Mané Garrincha, o espaço de um pequeno guardanapo era um enorme latifúndio”. É daí que afirmo que ele era o praticamente solitário de uma modalidade própria, que não era futebol, embora brotasse dele. Quando Mané parava em frente aos marcadores adversários e punha em marcha aquele ritual de ir mas não ir, de que importava o gol? Garrincha encarava os marcadores, dava vida a eles e, depois, num movimento rápido, mas simples, deixava-os para trás. Às vezes até mesmo empurrava a bola um pouco à frente, ameaçando entregá-la ao adversário, depois a recolhia, e partia. Armando Nogueira tem uma tese interessantíssima sobre os dribles de Garrincha, para ele, “o drible é, em essência, fingir que se vai fazer uma coisa e fazer outra; fingir, por exemplo, que se vai sair pela esquerda, e sair pela direita. Pois o Garrincha é a negação do drible. Ele pega a bola e pára; o marcador sabe que ele vai sair pela direita; o público todo sabe que ele vai sair para a direita; seu Mané mostra mais uma vez que vai sair pela direita; a essa altura, a convicção do marcador é granítica: ele vai sair pela direita; Garrincha parte e sai pela direita. Um murmúrio de espanto percorre o estádio: o esperado aconteceu, o antônimo do drible aconteceu”.

Essa descrição me faz lembrar um pequeno trecho da resenha de Marcelo Hessel, do Omelete, sobre o filme “Missão: Impossível III”. O crítico ressalta a marca que o diretor J. J. Abrams imprime no filme. O cineasta, antes de fazer com que o mocinho derrube os vilões coadjuvantes (daqueles coadjuvantes anônimos e mudos que são derrubados aos montes em filmes de ação), tem o cuidado de fazer com que a câmara se ocupe de apresentá-los: aproxima-se deles, mostra com um close os seus rostos, dá-lhes vida. Segundo Hessel, “é como se Abrams se importasse com eles, segundos antes de autorizar o trucidamento”. Abrams também faz algo semelhante em Lost, série televisiva de que é criador. Os fãs de Lost já estão acostumados ao seu estilo: antes de submeter os personagens às aventuras da história, Abrams tem o cuidado de apresentar minuciosamente cada um deles, com flashbacks.

Se procura-se fazer a mesma comparação com outros grandes dribladores, não dá certo. Maradona, por exemplo, com aquele golaço que marcou contra a Inglaterra na Copa de 1986, estaria muito mais para Quentin Tarantino que para J. J. Abrams. O deus argentino avançou com tanta velocidade e desprezo por seus marcadores, mais fugindo deles do que os encarando, que esses nem mesmo pareciam ter rosto; eram verdadeiramente coadjuvantes, panos de fundo da ação. Quem assistiu a Kill Bill vol. I e lembra-se da cena no restaurante japonês, certamente compreende a comparação.

Igual a Garrincha, em relação ao estilo de drible, jamais houve. Mas, a fim de esclarecer a diferença entre ele e os outros, cabe trazer à memória dois lances, ambos protagonizados por craques brasileiros. Romário, jogando pelo Flamengo, em 1999, pela Copa Rio São Paulo, pára com a bola nos pés já dentro da grande área; em frente a ele, a poucos centímetros, Amaral, o infeliz marcador; com um rápido elástico, num dos dribles mais incríveis que já vi, Romário deixa para trás o marcador corintiano atordoado e, com um leve toque do bico da chuteira, já quase sem ângulo, marca um gol simplesmente fantástico. Aí a torcida adversária teve que aplaudir. Amaral, tendo certamente comprometido a coluna, saiu do Corinthians pouco tempo depois.

O outro lance é protagonizado por Robinho, jogando pelo Santos, no final do Campeonato Brasileiro de 2002, contra o Corinthians. Com uma coragem e ousadia raras, sintomas de molecagem, ele avançou em direção ao marcador, o lateral direito Rogério, com as pedaladas que tornaram, definitivamente, a “pedalada” sua marca registrada. Atordoado com a ousadia do moleque franzino, Rogério foi recuando, recuando, recuando, entrou na área e, já fora de si, cometeu o pênalti.

A essência desses lances, tão fortemente marcados por um estilo mané, pode ser explicada citando-se Drummond: “se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irônico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios”.

Jogadas como as que o Mané fazia tão facilmente, bastando para tanto, que quisesse - e cujo estilo alguns raros jogadores foram capazes de imitar, como fizeram Rivelino e Romário, e fazem Robinho e Cristiano Ronaldo - produzem duas reações: alegria, dada a graça do drible, e pena, do “João”.

Denis Barbosa Cacique – 15 de setembro de 2007 (o bolão só termina quando o bolão acaba)

domingo, 16 de setembro de 2007

A Maldição do Campeão

Certa vez, eu e meu colega de cornetagem, Bruno, conversávamos sobre algumas das peculiaridades do futebol, vocês sabem, aquelas características que fazem do esporte bretão o mais belo, emocionante, poético e místico dentre todos os demais. Após vários argumentos, alusões e recordações, ambos chegamos a uma mesma conclusão: no mundo da bola, as leis estabelecidas pelas ciências não se aplicam de forma regular e previsível. Vejam, não estou dizendo que o futebol é totalmente sem nexo. Com efeito, as leis da lógica, da matemática e da física funcionam, como queria Kant, de forma necessária e universal durante a maior parte do tempo em que a bola rola. Contudo, existem alguns momentos, instantes de dimensão imensurável, durante os quais o futebol parece ser regido por algum tipo de deus do caos, que faz com que todas as supracitadas ciências falhem retumbantemente na tentativa de explicá-los racionalmente. Em tais momentos, temos a impressão de que os deuses sérios saem de férias e deixam o poder esférico nas mãos de uma espécie de Dioniso de chuteiras, ou de algum anjo decaído que possui os poderes de Hiro Nakamura. O fato é que a configuração espaço-temporal mostra-se totalmente distorcida e ainda não surgiu nenhum Einstein da bola que fosse capaz de explicar esses desvios.

Foram exatamente essas meditações cornetísticas que nos deram a idéia de criar a seção “Improbabilidades Infinitas”, um espaço onde nos propomos a relembrar e comentar os momentos e fatos mais estranhos, inacreditáveis e inexplicáveis do ludopédio. Nesta presente cornetagem, tratarei de uma coisa extremamente menosprezada por todos, ironizada pelos racionalistas de plantão, chamada de sobrenatural, fictícia, fruto de mentes delirantes. Não faltará quem me acuse de apreciador de filmes B tipo “Colheita Maldita” e das satânicas canções do Iron Maiden e afins. Mesmo assim, tenho de dizer que estou absolutamente convencido de que, pelo menos no terreno do futebol, ela existe e deve ser temida. Estou falando da maldição.

Ao procurarmos os exemplos e manifestações mais recentes de Lúcifer no mundo da bola, vamos parar direto na Europa, mais precisamente na UEFA. E este é um momento oportuno para falar sobre isso, uma vez que a nova temporada da Champions League, reduto mais badalado do momento para os corvos ludopédicos, está prestes a começar. A primeira pergunta que surge quando se inicia um certame é aquela de sempre: quem será o campeão? Liverpool, Chelsea, Manchester, Real Madrid, Barcelona, Internazionale? Muito difícil responder. Arriscar um palpite a essa altura é dar um tiro no escuro. Estou fora. Todavia, há algo que eu posso afirmar com segurança e sem medo de errar: o Milan NÃO será campeão.

Alguém logo perguntará: “Por quê? Existe uma razão que justifique essa afirmação temerária?”. Eu respondo: razão, razão mesmo não há. Contudo, existe sim e sem sombra de dúvidas... uma maldição: a “Maldição do Campeão”. Não é brincadeira, é fato: desde a temporada 1992/93, quando a antiga Copa dos Campeões da Europa passou a se chamar UEFA Champions League e a ter o presente formato, jamais um clube se sagrou bi-campeão. E mais: ao longo dessas quinze temporadas, apenas três campeões chegaram à final no ano seguinte ao título: Milan (94/95), Ájax (95/96) e Juventus (96/97). Fora isso, o melhor resultado de um campeão foi ter alcançado a semifinal: Borussia Dortmund (97/98) e Real Madrid (00/01 e 02/03). Os outros nove campeões caíram todos prematuramente.

E a coisa parece estar se agravando cada vez mais. No século 21, com exceção do Real Madrid, nenhum campeão chegou sequer à semifinal. O melhorzinho foi o Bayern que, em 01/02, chegou às quartas de final. Quanto aos outros,... uma tragédia pior que a outra.

Vejam só a história da temporada 03/04 e me digam se a coisa não ultrapassa os limites da razão. Nesse ano, a coisa foi tão feia que a maldição atingiu não apenas o atual campeão, como também o vencedor retrasado. O Real Madrid, que erguera a taça em 01/02, fazia uma boa campanha e chegou às quartas para enfrentar o inexpressivo Mônaco, cujos principais jogadores eram Morientes e Giuly (!!). Com Zidane, Figo e Ronaldo (em forma), o Real venceu a ida por 4x2, no Santiago Bernabeu. Fatura liquidada, certo? Diga isso para os corvos malditos. No jogo de volta, o time do principado fez 3x1, com direito a gol de letra do Giuly (!!!). Real eliminado pela regra dos gols marcados fora de casa.

Agora, se isso ocorreu com o campeão de dois anos antes, imaginem o que os corvos reservavam para o pobre Milan, ganhador do ano anterior. Os italianos, também nas quartas, pegaram o Deportivo La Coruña. Primeiro jogo, em San Siro: Milan 4x1. Festa rossonera: a vaga na semifinal estava garantida. Mas, no caminho havia uma... maldição. Carlo Ancelotti foi à Galícia crente de que bastava administrar o jogo. E que bela administração! No intervalo, o Deportivo já enfiava 3x0, placar suficiente para lhe garantir a classificação. Ainda assim, na segunda etapa, Fran teve tempo para decretar os 4x0. As semifinais do torneio foram: Chelsea x Mônaco e La Coruña x Porto. Estes foram os primeiros indícios de que 2004 se configurava como o ano da zebra no calendário ludopédico, o que foi confirmado logo em seguida com a conquista da Libertadores pelo Once Caldas e da Eurocopa pela Grécia. Ah, já estava me esquecendo: na final, o Porto bateu o Mônaco por 3x0. Um dos gols foi de... Carlos Alberto! (Sim, ele mesmo, do Corinthians, do Fluminense,...).

Chegamos então à temporada 04/05. O Porto quase caiu na primeira fase (o que seria inédito para um campeão). Uma vitória na bacia das almas contra o Chelsea evitou o pior. Mas nas oitavas não teve jeito: maldição. Na ida, em casa, 1x1 contra a Inter. Na volta, no Giuseppe Meazza (afinal, San Siro é o campo do Milan), 3x1 para os italianos.

Em 05/06, o Liverpool defendia o título, após consumar uma das maiores improbabilidades infinitas da história. Na final do ano anterior, foi para o intervalo tomando de 3x0 do Milan. No segundo tempo, o milagre: 3x3, seguido da vitória nos pênaltis, com Dudek no gol (ah, é uma improbabilidade mais infinita que a outra). Entretanto, no ano seguinte, isso já fazia parte do passado e os Reds tinham um adversário mais poderoso do que o Milan ou qualquer outro grande clube. Na primeira fase, tudo até que ia bem: Rafa Benítez cantou Don’t Let Me Down para os corvos e seu time terminou em primeiro lugar num grupo que tinha o Chelsea. Nas oitavas, encararia o inofensivo Benfica. Inofensivo em situações normais, mas desta vez os portugueses tinham o Sobrenatural de Almeida como seu fiel escudeiro. Resultado: duas derrotas dos Reds, sem marcar nenhum gol, incluindo um 2x0 em pleno Anfield Road. Essa temporada acabou por consagrar o Barcelona e mais uma improbabilidade infinita: na final, 2x1 sobre o Arsenal, de virada. Quem fez o gol do título? Sim, ele mesmo... BELLETTI.

A temporada 06/07 pintava como a grande chance de se pôr fim às lucubrações satânicas que vinham assombrando a liga há tantos anos e mandar os corvos de volta às profundezas do limbo. Afinal, o Barça, um império de tradição ludopédica, dono de um verdadeiro timaço, parecia ser à prova de maldições. “Més que un club!”, bradam os catalães. “Més que una maldición!”, bradaram os corvos. A tragédia blau-graná já começou no sorteio: um grupo com Chelsea, bi-campeão inglês, e Werder Bremen, vice alemão. E tudo ficou realmente complicado após as batalhas (literalmente) contra os Blues. A derrota em Standford Bridge e o cruel 2x2 no Camp Nou, com aquele gol do Drogba aos 45 da etapa final, colocaram o Barça em terceiro lugar. Só que aí, os corvos resolveram dar uma breve trégua. Os catalães passaram para o mata-mata, graças aos 2x0 sobre o Bremen, com gol de Gudjohnsen e tudo (ah, essas improbabilidades não acabam mais). Mas então veio o Liverpool e a maldição deu as caras de novo. Derrota por 2x1 de virada, em pleno Camp Nou, com gol de pé direito do Riise (!!). Na volta, o Barça foi bravo e venceu por 1x0, gol de... pois é, Gudjohnsen. Inútil: os gols fora de casa foram fatais.

Resumo da ópera: os tifosi milanistas podem ir colocando as barbinhas de molho. A festa, após a vingança contra o Liverpool, foi boa enquanto durou. Agora, a nova temporada promete ser negra, pelo menos no que se refere à Champions League. A primeira fase até que deve ser tranqüila, contra Benfica, Celtic e o poderosíssimo Shakhtar Donetski. Mas depois é que eu quero ver. Se o Milan cair nas oitavas, alguém ainda duvidará dos poderes sinistros que rondam os gramados europeus? E não adianta matar os corvos. Satanás ludopédico enviará outras aves agourentas para nos assombrar. A Maldição do Campeão é real.