quinta-feira, 5 de julho de 2007

Dunga e o pombo do Skinner


Nos meados dos anos 40, buscando uma explicação fundamentada no comportamento para as superstições humanas, o psicólogo americano B. F. Skinner realizou o seguinte experimento: pegou uma série de pombinhos (contrariando o clichê, Skinner preferia pombos a ratos...) famintos e colocou cada um em uma gaiola. Às gaiolas estava acoplado um mecanismo que nelas despejava uma pequena quantidade de comida em intervalos regulares. Tal mecanismo não poderia ser, de forma alguma, alterado pelo compotamento do pombo. O experimento (embora os resultados sejam severamente questionados) revelou que os pombos acabavam por associar seu comportamento com a entrega da comida e , tendo feito essa co-relação, repetiam esse comportamento como forma de obter mais comida. Por exemplo, se, por coincidência, um pombo esteve com a asa direita levantada durante algumas vezes em que o mecanismo de entrega de comida se ativou, este passaria a levantar a asa direita sempre que quisesse comer. Ou seja, o pombo passava a "acreditar" que era o seu levantar de asa direita que lhe garantia o alimento.

Agora voltemos ao futebol. Como não foi postada aqui uma autópsia do jogo Brasil e Chile (mea culpa), incluirei aqui uma breve explicação da mudança tática realizada por Dunga no segundo tempo da partida (no primeiro, o time apresentou os mesmos problemas citados na autópsia anterior). Vencendo por 1 a 0, Dunga resolveu apostar em contra-ataques pelas pontas que visavam "alargar" o campo para abrir a defesa adversária. Para isso, Dunga precisava de velocidade e de força física. Por isso, substitui Anderson por Júlio Baptista. E posicionou o meia bem aberto pela esquerda, praticamente sem responsabilidades defensivas. Robinho, que jogava por ali, foi então deslocado pela direita em função semelhante (sempre aberto ou em "diagonal" com Júlio Baptista). Com isso, Elano foi deslocado da direita para a frente dos cabeças-de-área (Mineiro e Gilberto Silva). Dunga mudou, então, o esquema de um 4-4-2 para um "pseudo 4-3-3" (ou 4-3-2-1 como preferem a ESPN e o FIFA 07). Na prática, contudo, Elano atuou mais como um terceiro volante do que como um homem de ligação. Embora, a nomenclatura (como o segundo volante, em teoria, é menos defensivo que o primeiro, o terceiro deveria ser ainda menos que os dois...) indicasse que Elano estaria mais livre para apoiar, não foi isso que ocorreu. Os laterais ganharam um pouco mais de liberdade (em ataques alternados), mas, o posicionamento de Elano como um terceiro "primeiro-volante" manteve o problema de falta de chegada ao ataque. Com isso, o Chile ganhou espaço e sentiu que poderia empatar o jogo. Com o meio campo perdido, Dunga substituiu Elano e colocou um primeiro-volante de ofício: Josué. Pouco depois, Robinho, em contra-ataques rápidos, fez dois gols que garantiram a vitória.

Quando a manutenção desse esquema do final segundo tempo com os três volantes (Gilberto Silva, Mineiro e Josué) foi anunciada como a escalação inicial contra o Equador, parecia óbvio que o técnico brasileiro parecia contentar-se com o empate. Contudo, quando perguntado sobre a retranca, Dunga negou-a veementemente. Alegando que a seleção tinha feito mais gols com três volantes do que com dois. E, essa é a parte assustadora. O Brasil fez dois gols quando tinha três volantes (como ele disse), mas não "porque" tinha três volantes (como parece acreditar). O Brasil fez dois gols porque o Chile gostou do jogo e se lançou ao ataque para buscar o empate, o que expôs em excesso zaga a contra-ataques (o que tem grandes chances de ser letal quando se enfrenta um time com jogadores velozes como Robinho). Dunga agiu como o pombo supersticioso de Skinner ao acreditar que seus três volantes resolveriam o problema de criação de jogadas de ataque. Mesmo liberando os laterais, mantém-se o mesmo número de homens "proibidos" de passar da linha do meio-de-campo. Bastou ouvir a escalação e a explicação do técnico Dunga para que eu me preparasse para o jogo ridiculo que estava por vir e me amaldiçoasse ferozmente por ter apostado em um 4 a 1 para a seleção no oráculo dos corneteiros (eu devia estar bêbado quando dei esse palpite. Não é possível...). Mas, mais do que decepcionado pelo futebolzinho ridículo que estava destinado a assistir, mais do que puto por ter me ferrado no Oráculo dos corneteiros, fiquei intrigado pela dúvida que surgiu em minha mente: seria o técnico brasileiro um retranqueiro envergonhado (e mentiroso) ou um "pombo supersticioso"? Lembrando dos jogos anteriores, a segunda me pareceu mais plausível. Afinal, nunca tivemos sinal algum de vergonha. Mas, de retranca...

Bruno
(que irá ao XV Encontro Internacional de RPG no sábado e não sabe se estará de volta a tempo de ver o próximo jogo da seleção).

7 comentários:

Denis Barbosa Cacique disse...

Interessante efeito produzem as frases do tipo "Dunga acreditou que...", "Dunga disse que..." ou "Dunga negou que...". Um pouco por causa dos vestígios de contos de fada que se instalaram na minha mente qdo eu era criança (e são vestígios pra caralho), e outro pouco porque o técnico da seleção parece tão ingênuo como uma criança, é q toda vez q me deparo com esse tipo de frase tenho a impressão de q estão falando de um ser ridículo qualquer. Um exemplo. Um exemplo de como não se deve ser, a não ser q se queira parecer (como diria o Bruno) ridddddículo!!
Esse esquema do Dunga é horrível. Até seria justificável se tivéssemos dois ótimos alas, como foram há tempos atrás Cafu e Roberto Carlos (segurem a corneta: os caras foram bons sim) e um armador nato, tipo o Kaká. Mas o Gilberto é caneleiro. Daniel Alves é descontrolado, dribla mal, apoia pouco... E La Bestia... bem.. lo proprio nombre abla tudo (e q ninguém queira corrigir meu portunhol!)...

César Zambon disse...

Análise perfeita, Bruno.
Certas pessoas teimam em confundir a relação causa-efeito com a mera sucessão temporal. É por isso que eu digo: Hume deveria ser ensinado na escola.
E Dênis, sinto muito, não segurarei a corneta, não: Cafu e Roberto Carlos enganaram os trouxas e até os não-trouxas como você (aliás, essa é outra confusão mais antiga do que andar para frente: tomar a aparência pela realidade).

César Zambon disse...

ah, Dênis... HABLAR é com H. E é "el propio (sem r mesmo)nombre"

Denis Barbosa Cacique disse...

César, Cafu e Roberto Carlos foram os melhores alas brasileiros q eu vi jogar - e é nisso q eu estava pensando qdo disse "ótimos laterais". Alguns outros jogadores tiveram melhores momentos, como Serginho, pela esquerda, e Cicinho, pelo Direita. Mas nenhum destes conseguiu manter um bom nível por muito tempo, como fizeram aqueles. Não duvido q o Júnior, aquele do flamengo, tenha sido melhor jogador do q estes dois, mas o problema é q eu não o vi jogar. Qdo Branco e Jorginho jogavam, eu entendia de futebol muito menos do q entendo hje, e isso é realmente muito pouco... Então... se eu tiver q escolher os dois melhores laterais brasileiros, ficaria com Cafú e R Carlos mesmo. Cara, e digo mais: acho q colocaria eles no lugar de Gilberto e Daniel Alves.

Denis Barbosa Cacique disse...

...do mesmo modo q eu colocaria o Gordo no lugar do Love.

César Zambon disse...

Sou obrigado a concordar com a última: O Ronaldo pesando 120 kg joga mais do que todos esses Afonsos, Vágners Loves e Freds juntos.

Anônimo disse...

Quase três anos depois, leio esta postagem. Não está lá muito exata em termos do experimento de Skinner, mas está muito interessante.
Mas terá o Mainardi chupado esta postagem pra redigir sua última coluna na Veja, sem dar a fonte da inspiração?
Ou vocês são escritores-fantasma do cara?